sábado, 1 de outubro de 2011

Sangue na sapatilha ou o enigma da liberdade*

Para Pina Bausch


De criança, brincávamos de esconde-esconde.
Ainda se lembra de nossos jogos?
Todos se escondem, um espera
O rosto contra uma árvore ou parede
As Mãos sobre os olhos, até que o último
Encontre seu lugar, e quem for descoberto
Tem de correr do pegador.
Se chegar peimeiro na árvore, está livre.
Se não fica parado no lugar
Como se bater a mão numa árvore ou parede
O pregasse ao chão como pedra sepulcral
Ele não pode se mover até que o último
Seja encontrado. E ás vezes o último
Por estar tão bem escondido, não é encontrado.
Então todos esperam, petrificados
Cada qual seu próprio monumento, pelo último.
E ás vezes acontece morrer um.
Seu esconderijo não é encontrado, não há
Fome que o faça escapar da sua morte
Aquela que o encontrou fora da fita
Os mortos não têm mais fome.
Então não há ressurreição. O pegador
Revirou cada pedra quatro vezes.
Agora só pode esperar, o rosto
Contra a árvore ou parede
As mãos sobre os olhos, até que o mundo
Tenha passado por ele. Você percebe seu andar
Ponha suas mãos sobre os olhos, irmãos.
Os outros, que o pegador pregou ao chão
Ao bater a mão numa árvore ou parede não correram
Depressa de seu esconderijo que não era bem seguro,
Eles agora não têm mais sobre seus olhos as mãos,
Não mais podem se mover e também os olhos não podem fechar
De acordo com as regras do jogo.
Como pedras no cemitério esperam eles
Com os olhos abertos para o último olhar...



Heiner Müller