domingo, 6 de maio de 2012

heiner müller / as imagens


As imagens significam tudo a princípio. São sólidas. Espaçosas.
Mas os sonhos coagulam, fazem-se forma e desencanto.
Já o céu não há imagem que o fixe. A nuvem vista do
Avião: um vapor que nos tira a vista, o grou, um pássaro, mais
nada
Até o comunismo, a imagem final, sempre refrescada
Porque lavada com sangue tantas vezes, o dia-a-dia
Paga-lhe um salário modesto, sem brilho, cego de suor,
Escombros os grandes poemas, como corpos muito tempo
amados e
Postos de lado agora, no caminho da espécie exigente e finita
Nas entrelinhas lamentos

sobre ossos feliz o carregador de pedra

Porque o belo significa o fim provável dos terrores.

sexta-feira, 30 de março de 2012

"Eu queria ser uma mosca para pousar em todos os cabarés da cidade."  PÚBLICO - ATO I

domingo, 18 de março de 2012

Grace, Alaíde e eu.

Escolhi esse. Um modelo de vestido histórico que fez de Grace Kelly uma princesa. Nesse vestido busquei encontrar as razões e os sentidos que desejei para Alaíde. Vitória? Prisão? Sufoco? E por dentro um desejo de liberdade. Grace sim, viveu coisas que Alaíde gostaria de ter vivido. Adorava noitadas cheias de drinks com as amigas baladeiras e tinha uma agenda cheia de amantes. Viveu uma relação conjugal longe da ideia do conto de fadas, seu príncipe era controlador e possessivo, proibiu que os filmes com Grace fossem exibidos em Mônaco e cortou qualquer aspiração que ela tivesse de retomar a carreira. Além do histórico de traições de ambos. Assim como Grace, Nelson Rodrigues me mostra uma Alaíde traída e também capaz de trair. Uma louca cheia de desejos que me fez revelar segredos íntimos como os do diário de Mme. Clessi, que deu oportunidade de olhar nos olhos das pessoas e protestar conflitos cotidianos. Assim tenho visto o teatro em mim se transformar em vida. Fazer com que a cidade compartilhe de um Nelson, o meu Nelson. Assim minha Alaíde corre com a grinalda rasgada, sem o glamour de uma princesa ou rainha. Foge, quer ser livre, fazendo do asfalto o seu diário para dizer o que pensa e o que sente.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Um vestido de noiva

    Sinal fechado da Av. Duque de Caxias. 


Para Alaíde


Sempre tive um fascínio por noivas, vejo como um momento em que a mulher se torna princesa, cinderela de só um dia que quando o sonho acaba é preciso deixar o vestido. O vestido, especialmente o vestido é o que me prende e não me faz deixar de olhar. Branco, Saia pesada de cetim, mangas longas de ombreiras bufantes, frente com formato de coração e o colo acompanhado de renda, costas também em renda com mais ou menos 32 botões de feixe e a rosto da minha irmã triste, porque esse não era o modelo de vestido que ela queria casar. Bege, tomara que caia, saia pesada, cauda longa, o busto trabalhado no mix de pérolas com cristais e Ivana encantada com seu vestido, menos com o marido. 2 Lençois branco, um amarrado na cabeça, o outro amarrado como um lanço na altura do busto e eu satisfeitíssima casava sem noivo, sem padre e sem convidados no corredor da minha casa. Desisti dos lençois e comecei a desenhar diversos modelos de vestidos de noivas, cada vez que terminava um logo inventava outro, assim satisfazia em mim um desejo de vestir todos vestidos que desenhava sem que fosse necessário um casamento para isso. Pois era a mim quem eu desenhava e todos os vestidos que eu desejava casar. Acredito que fazer um vestido de noiva é dificil não por seu volume, mas, por toda sua riqueza de detalhes que enche os olhos. Certa vez participava do processo de um espetáculo com somente três atrizes em cena onde suas personagens representavam três irmãs, orfãs de pai e de mãe. Como a mãe na história era uma figura forte e queríamos po-la em cena, não decidimos por fotografias ou qualquer outra imagem figurativa e sim por um vestido de noiva. Poderíamos ter comprado ou mandado fazer, mas, pra mim naquele momento foi importante eu mesma construir esse vestido. Comprei os tecidos, os veús, cordões de pérolas e com uma tesoura, uma agulha e um tubo de linha branca fiz a mão o meu primeiro vestido de noiva.


Para exercício cênico do 13º Ato, na disciplina de montagem do IFCE.

sábado, 1 de outubro de 2011

Sangue na sapatilha ou o enigma da liberdade*

Para Pina Bausch


De criança, brincávamos de esconde-esconde.
Ainda se lembra de nossos jogos?
Todos se escondem, um espera
O rosto contra uma árvore ou parede
As Mãos sobre os olhos, até que o último
Encontre seu lugar, e quem for descoberto
Tem de correr do pegador.
Se chegar peimeiro na árvore, está livre.
Se não fica parado no lugar
Como se bater a mão numa árvore ou parede
O pregasse ao chão como pedra sepulcral
Ele não pode se mover até que o último
Seja encontrado. E ás vezes o último
Por estar tão bem escondido, não é encontrado.
Então todos esperam, petrificados
Cada qual seu próprio monumento, pelo último.
E ás vezes acontece morrer um.
Seu esconderijo não é encontrado, não há
Fome que o faça escapar da sua morte
Aquela que o encontrou fora da fita
Os mortos não têm mais fome.
Então não há ressurreição. O pegador
Revirou cada pedra quatro vezes.
Agora só pode esperar, o rosto
Contra a árvore ou parede
As mãos sobre os olhos, até que o mundo
Tenha passado por ele. Você percebe seu andar
Ponha suas mãos sobre os olhos, irmãos.
Os outros, que o pegador pregou ao chão
Ao bater a mão numa árvore ou parede não correram
Depressa de seu esconderijo que não era bem seguro,
Eles agora não têm mais sobre seus olhos as mãos,
Não mais podem se mover e também os olhos não podem fechar
De acordo com as regras do jogo.
Como pedras no cemitério esperam eles
Com os olhos abertos para o último olhar...



Heiner Müller